segunda-feira, 25 de março de 2013

Conheço?



- Oi. Tudo bem? - Aquele momento em que você pensa: eu conheço?
A mulher na sua frente. Estática. Esperando uma reação e você lá, esperando entender. Ah! A educação. Essa coisa maravilhosa e que às vezes nos inferniza. Fosse eu um pouco menos civilizada, diria não e sairia dali, indo em direção a alguma outra vitrine, mas não. Minha mãe se esmerou na educação dos filhos. Resultado: sorriso forçado. Não aquele sorriso leve. De canto. Aquele sorriso de pum mesmo. Amarelo. Que não mostra os dentes. Esse é o melhor que eu consigo dar praquela pessoa.
- Oi. Tudo. E você? – respondi.
 Vai que conheço mesmo. Minha memória é péssima. Já é motivo de anedota na família. Teve uma vez que não reconheci uma vizinha que morava ao lado de casa há uns cinco anos. Nunca fui muito sociável. Eu e meus livros éramos mais aparentados que qualquer outro membro da família, imagina se eu ia conhecer quem jogava lixo sobre o muro do lote da casa dos meus pais?!
- Tudo ótimo, menina. A Fernanda vai se casar semana que vem. Você precisa ver como ela está ansiosa.
 Era tudo o que eu precisava. Não bastasse ter que me recordar da senhora à minha frente, agora tínhamos um segundo personagem. E pior. Apenas com os dados de nome e às vésperas de núpcias. Lembra, Elle... Lembra... Quantas amigas mesmo que você tem em idade casadoira e que estão querendo casar ou que estão conseguindo - conseguindo é muito importante -casar? Pensa... Envio o máximo de estímulos pro meu cérebro lerdo. Processa cérebro, processa... Sorriso fica um pouco torto agora. Desfeito pelo esforço. Tô tentando gente, tô tentando.
- Olha. Que coisa... Que bom... Fico feliz por ela... Tá tão difícil encontrar alguém bacana hoje em dia... Um homem bom é muito difícil...
Epa! Porque ela franziu o cenho? Frio na espinha. Eu sei, eu sei. Deveria ter dito que não me lembrava dela já no segundo parágrafo, mas eu sou assim... Não dou conta. E se eu conhecesse a dita. Como ela ia se sentir? Magoada, no mínimo. E se fosse comigo? Então vamos tentando manter a farsa... Até que ela se complica. E fica insustentável. Por que ela mudou a expressão mesmo?
- Homem? Não, menina. Então você não sabe? A Fê vai casar com a Clara. Agora que a família da Clara finalmente aceitou. Finalmente, viu? Ela até ameaçou se matar. Imagina?
É imagino... Imagino o que vou fazer agora. Digo pra ela “Que bom que as coisas deram certo afinal” ou tiro a máscara e digo “sinto muito, mas não sei quem você é”? Seria simples. Se eu fosse simples. Se não tivesse problemas que Freud se encarregaria de assinalar como relações ambíguas. Sabe como é: castração, sentimento de amor e ódio, talvez uma pitada de necessidade de apreciação. De ser boazinha.
- Não. Eu não sabia.
 Seria ótima oportunidade. Um “Olha uma blusa linda ali que quero. Bom te ver. Se cuida, viu?” resolveria.  Por que não falo isso?  Não tenho tantas vidas assim e a curiosidade, você sabe,  me mata qualquer hora.
- Mas como foi que elas convenceram a família da Clara?
- Há! Foi fácil até. O seu marcos foi pego saindo do motel com o namorado. Aí não teve mais como, né?! Tanta hipocrisia... Um homem casado! Veja bem. As meninas ficaram felizes. Hum... Olha. Acho que não conheço você. Você não é a Fabíola, ex-namorada do Pedro que é filho do Rodrigo e da Lúcia que a mãe morreu ano passado?
- Não senhora. Não sou.
Sorriso fica mais sincero agora. Meio tímido. Mas, ufa! Finalmente ela se deu conta da confusão.
- E você não tem vergonha? Ficar perguntando da vida dos outros assim? Pura fofoca. Essa gente que não tem mais o que fazer!
A dona me dá as costas e vai embora. Pisando alto. Coisas que eu realmente mereço. Levei bronca por tentar ser educada. Culpa da minha mãe. Será que Freud entenderia minha queixa?



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